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Por que sinto perigo o tempo todo? O “Alarme Interno” nos corpos hipermóveis

ansiedade e alarme interno nos corpos hipermoveis

Conteúdo

Se a sua ansiedade não se manifesta apenas como preocupação mental, mas como uma experiência avassaladora e visceral (palpitações, tontura, a sensação constante de que algo está errado no seu corpo) você está no centro de uma área de pesquisa que está transformando a compreensão da saúde mental.

A neurociência demonstra que, para indivíduos com hipermobilidade articular generalizada (ou frouxidão ligamentar), Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), transtorno do espectro de hipermobilidade (TEH) e neurodivergências como o TEA, a ansiedade, portanto, tem raízes profundas na forma como o cérebro processa o estado físico do corpo; sendo assim, esses sinais internos acabam influenciando diretamente a percepção de ameaça.

Essa vulnerabilidade psiquiátrica está intimamente ligada às variações no tecido conjuntivo e à forma como o cérebro interpreta os sinais corporais.

As fontes científicas identificam a amígdala e o córtex insular (ou ínsula) como as principais regiões cerebrais responsáveis por traduzir as sensações internas em percepção de medo e perigo.

A Amígdala: o centro de alerta sempre ligado

A amígdala é a parte do nosso cérebro que funciona como o centro de detecção e percepção de ameaças. Além disso, sua principal função é integrar o que sentimos no ambiente externo com o estado fisiológico do nosso corpo, permitindo, portanto, que o cérebro reaja de forma coerente aos estímulos ao nosso redor.

Para muitas pessoas com hipermobilidade, esse sistema de alarme parece estar em hipervigilância:

  • Diferença Estrutural: Estudos de neuroimagem mostram que indivíduos hipermóveis apresentam um volume da amígdala bilateral significativamente maior em comparação com indivíduos não-hipermóveis. É notável que o tamanho desse efeito é comparável, ou até superior, ao observado em estudos de populações psiquiátricas clínicas.
  • Reatividade Amplificada: Em participantes hipermóveis que também sofrem de ansiedade clínica, a amígdala demonstra atividade amplificada, especialmente ao processar estímulos socioemocionais.

Essa hiperatividade sugere uma predisposição constitucional a sintomas afetivos, tornando o cérebro mais suscetível a interpretar sinais corporais como ameaça. Sendo assim, o sistema nervoso reage de maneira exagerada a situações que, para outras pessoas, seriam neutras.

A Ínsula: O “Hub” da interocepção ruidosa

Se a amígdala é o detector de ameaças, então o Córtex Insular (Ínsula) é a região essencial que processa a interocepção, ou seja, o sentido que monitora o estado fisiológico interno do corpo. Além disso, emoções como a ansiedade frequentemente carregam “assinaturas sensoriais viscerais” no corpo, como “coração acelerado”, “tensão muscular” ou “estômago revirando”.

A neurociência aponta que a ínsula é um verdadeiro nexo da experiência afetiva em pessoas ansiosas e hipermóveis.

Aumento da Reatividade

Pesquisas de neuroimagem funcional revelam que indivíduos com hipermobilidade apresentam maior reatividade neural no córtex insular. Como resultado, o cérebro deles responde de forma mais intensa aos sinais corporais, o que acaba amplificando a percepção de desconforto e tornando essas sensações mais difíceis de ignorar.

O “Ruído Interoceptivo”

A teoria por trás dessa comorbidade sugere que as alterações no tecido conjuntivo — comuns na Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), no transtorno do espectro de hipermobilidade (TEH) e na hipermobilidade articular generalizada — podem levar a uma sinalização interoceptiva imprecisa ou “ruidosa”, também chamada de “ruído interoceptivo”.

O corpo envia sinais inesperados, e o cérebro, especialmente a ínsula, interpreta isso como uma “surpresa interoceptiva”. Essa sensação motiva o aprendizado emocional e intensifica os sentimentos de ansiedade.

Em resumo, o cérebro hipermóvel está constantemente tentando decifrar um corpo que envia mensagens confusas. Essa comunicação distorcida acaba gerando uma percepção ampliada de alerta e desconforto.

Ansiedade Frequente

Entre todas as condições associadas à hipermobilidade, a ansiedade é a que possui o suporte empírico mais sólido. Isso reforça que a ansiedade, que é um sintoma transdiagnóstico (comum em vários transtornos psiquiátricos), é frequentemente mediada por essa disfunção na leitura corporal.

A neurociência moderna confirma que essas conexões entre corpo e cérebro não são apenas metafóricas, mas fisiológicas. Portanto, compreender essas vias ajuda a tratar a ansiedade de forma mais eficaz, respeitando as particularidades neurobiológicas de quem vive com hipermobilidade.

Implicações práticas: como intervir no eixo corpo-mente

Compreender que o medo e a ansiedade vêm de um cérebro que recebe sinais imprecisos de um corpo estruturalmente diferente é o primeiro passo para um tratamento eficaz.

A ansiedade já é um desafio significativo em populações neurodivergentes (TEA), mas quando combinada com a hipermobilidade, a intervenção deve ser direcionada para o eixo neurovisceral, ou seja, para a relação entre corpo e mente.

Orientação prática e terapêutica

Regulação cerebral direcionada

As intervenções devem buscar regular a reatividade da amígdala e aprimorar a precisão interoceptiva. Isso pode trazer benefícios significativos para indivíduos hipermóveis que apresentam sintomas de ansiedade.

Foco interoceptivo

O treinamento interoceptivo é uma ferramenta promissora que já demonstrou reduzir a ansiedade em adultos autistas. Ao melhorar a precisão interoceptiva, a ansiedade gerada pela sinalização corporal “ruidosa” pode ser significativamente reduzida.

Abordagem multidisciplinar

A validação e o manejo apropriado dos sintomas físicos (como dor crônica e disautonomia) são essenciais para reduzir o estresse corporal e, consequentemente, a ansiedade. Uma abordagem que envolva neurologistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e psicólogos é o caminho mais indicado.

Lembre-se: A ansiedade no contexto da hipermobilidade não é apenas “nervosismo”. Ela é uma manifestação fisiológica de como o corpo se comunica com o cérebro. Reconhecer essa realidade é um passo poderoso em direção à validação e ao cuidado que você merece.

A neurociência mostra que compreender essa comunicação interna é essencial para desenvolver empatia e estratégias terapêuticas eficazes. Portanto, ouvir o corpo é também uma forma de se curar.

A ansiedade visceral em pessoas com hipermobilidade e neurodivergência está ligada à forma como o cérebro processa sinais corporais. Regiões como a amígdala e a ínsula amplificam respostas de alerta, interpretando estímulos físicos comuns como perigo, o que intensifica sintomas ansiosos.

Conclusão

A neurociência nos ajuda a entender que a ansiedade em corpos hipermóveis é mais do que uma questão emocional: é uma resposta biológica. Reconhecer isso é essencial para promover cuidado, compreensão e bem-estar.

Se você vive com hipermobilidade e sente que o corpo e a mente estão sempre em alerta, saiba que existe explicação e caminhos possíveis para aliviar essa sensação.


Bibliografia

Leia também: Desmistificando a dor na hipermobilidade

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Kaliny Trevezani

Médica Pediatra - CRMDF 20469 / RQE 12424

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Dra Kaliny Cristine Trevezani de Souza
Pediatra – CRMDF 20469 / RQE 12424

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