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Hipermobilidade e autismo: Desvendando o elo Invisível entre o corpo e a neurodivergência

Hipermobilidade e autismo

Conteúdo

Se você convive com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), seja em você ou em alguém que você ama, e sente que há um universo de sintomas físicos persistentes que parecem não se encaixar no “pacote” autista típico, então saiba que você não está sozinho.

Nos últimos anos, a ciência vem iluminando, de forma cada vez mais consistente, uma comorbidade profunda e frequentemente subestimada: a ligação entre o TEA e a Hipermobilidade Articular. Sendo assim, essa relação abrange condições como o Distúrbio do Espectro de Hipermobilidade (HSD), a Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), o Transtorno do Espectro de Hipermobilidade (TEH) e a hipermobilidade articular generalizada, também conhecida como frouxidão ligamentar.

Diante disso, essa conexão sugere que a variação constitucional no tecido conjuntivo, o “cimento” que dá estrutura ao nosso corpo, pode, portanto, ser um fator que predispõe tanto à neurodivergência quanto a sintomas físicos complexos, dor e disautonomia.

Compreender essa comorbidade não é apenas uma questão de diagnóstico, mas de cuidado integral.

Implicações clínicas: quando o corpo grita

A hipermobilidade é caracterizada pela frouxidão do tecido conjuntivo e, por consequência, seus efeitos são amplos. Como o colágeno está distribuído por todo o corpo, dos tendões aos vasos sanguíneos e ao sistema nervoso, suas alterações não se limitam às articulações. Assim, em pessoas com TEA, essa comorbidade pode potencializar ou adicionar desafios significativos.

O desafio musculoesquelético e a dor crônica

  • Hipermobilidade e dor: A dor musculoesquelética é uma implicação clínica comum. Em indivíduos com Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), TEH e hipermobilidade articular generalizada, a dor crônica e a fadiga são queixas frequentes. Essa dor é descrita como cansativa e exaustiva (em até 93% dos pacientes) e pode ser constante (em cerca de 67%).
  • Instabilidade articular: A frouxidão articular leva a uma maior propensão a luxações e subluxações (deslocamentos) articulares.
  • Problemas motores e propriocepção: A disfunção do tecido conjuntivo pode estar ligada ao desenvolvimento cerebral atípico. Isso se manifesta em dificuldades de coordenação motora, atraso no desenvolvimento motor, clumsiness e propriocepção prejudicada (especialmente relevantes em pessoas neurodivergentes).

Disfunção Autonômica (Disautonomia)

A hipermobilidade serve como um elo entre a neurodivergência e a disautonomia.

  • Sintomas Ortostáticos: Distúrbios do sistema nervoso autônomo, como a Síndrome de Taquicardia Postural Ortostática (POTS), são frequentemente observados.
  • Problemas Gastrointestinais (GI): Manifestações gastrointestinais são comuns, incluindo dismotilidade GI, refluxo gastroesofágico (GERD), inchaço, constipação, náuseas e disfagia (dificuldade para engolir).

Sintomas Neuropsiquiátricos e ESSENCE

Além disso, a complexidade da Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), do TEH e da hipermobilidade articular generalizada pode agravar ainda mais os sintomas já presentes no TEA.

Adicionalmente, os sintomas de ESSENCE (Síndromes Sintomáticas Precoces que Eliciam Exames Clínicos Neurodesenvolvimentais) estão associados à Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), ao TEH e à hipermobilidade articular generalizada/JHS, dessa forma, isso reforça a importância dessa investigação conjunta.

  • Saúde Mental: Há forte associação entre hipermobilidade e transtornos de ansiedade, ataques de pânico e depressão. Pessoas com essas condições apresentam risco significativamente maior de ansiedade e depressão.
  • Desregulação Emocional: Ansiedade, apatia e depressão são aspectos psicossociais relevantes.
  • Outros Desafios Neurodesenvolvimentais: Problemas como hiperatividade/hipoatividade, desatenção, dificuldades de fala/linguagem e problemas emocionais estão associados à hipermobilidade.

Implicações de apoio: cultivando a compreensão e o cuidado

Nesse contexto, a jornada de quem vive com hipermobilidade e TEA costuma ser marcada por grande complexidade e, muitas vezes, pela falta de reconhecimento. Por isso, o cuidado precisa acompanhar essa realidade multifacetada.

Reconhecimento e validação: o ponto de partida

Sendo assim, é fundamental que profissionais considerem a hipótese de um Distúrbio Hereditário do Tecido Conjuntivo (DHTC) em crianças com sintomas ESSENCE, incluindo o Transtorno do Espectro Autista. Isso implica identificar condições como a Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), o Transtorno do Espectro de Hipermobilidade (TEH) e a hipermobilidade articular generalizada.

Reconhecer essa interconexão favorece encaminhamento precoce e tratamento mais adequado.

O que vivenciamos

Portanto, muitos pacientes com essas condições relatam interações negativas com profissionais de saúde, sentindo-se estigmatizados ou mal compreendidos. A longa “odisseia diagnóstica”, por sua vez, contribui para o sofrimento. Assim, uma escuta empática é essencial para compreender a natureza da condição.

Abordagem holística e multidisciplinar

O manejo da Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), do TEH e da hipermobilidade articular generalizada, especialmente quando coexistem com o TEA, requer uma abordagem multidisciplinar para lidar com a manifestação multissistêmica da condição.

Estratégias de gerenciamento da dor e reabilitação

Fisioterapia e Terapia Ocupacional

O tratamento primário foca em queixas musculoesqueléticas. Intervenções terapêuticas visam melhorar a função musculoesquelética, aumentar a força, a estabilidade do tronco e o tônus muscular, reduzindo assim a tensão articular. A fisioterapia é crucial para recuperar o tônus muscular e melhorar a propriocepção.

Gerenciamento da Dor

Para a dor crônica, uma abordagem multifatorial é necessária. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), combinada com fisioterapia, melhora os aspectos físicos e emocionais da dor, contribuindo para melhor Qualidade de Vida (QoL).

Foco na qualidade de vida e participação

As consequências da hipermobilidade no TEA frequentemente incluem isolamento social, redução da qualidade de vida e limitações na participação em atividades diárias e profissionais. Orientação prática ao buscar apoio:

  1. Rastreamento multissistêmico: priorize ferramentas que avaliam o impacto multissistêmico dos sintomas, permitindo um planejamento de tratamento mais direcionado.
  2. Ansiedade e sensações corporais: sensações atípicas, incluindo disautonomia e dor, podem intensificar a ansiedade. Apoio psicológico voltado para regulação emocional e aceitação é essencial.
  3. Adaptações na rotina: Dor e fadiga exigem ajustes. A hipermobilidade pode causar intolerância ao exercício e aumentar o sedentarismo. A gestão deve focar na participação gradual e no bem-estar psicológico.

É essencial que os profissionais de saúde compreendam o amplo leque de sintomas e o impacto na QoL para fornecerem um cuidado de melhor qualidade. Reconhecer que o corpo está profundamente conectado à neurodivergência é o primeiro passo para um cuidado realmente efetivo e compassivo.


Bibliografia

Leia também: Autismo e Hipermobilidade em Meninas

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Kaliny Trevezani

Médica Pediatra - CRMDF 20469 / RQE 12424

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Dra Kaliny Cristine Trevezani de Souza
Pediatra – CRMDF 20469 / RQE 12424

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